Servidora acusa Marquinhos Trad de destruir relação com assédio sexual em 2015

15/08/2022 10h54 - Atualizado há 2 anos

Mulher entregou prints na Polícia que supostamente mostram então deputado falando de 'sentimento' após ter visto a vítima só uma vez na vida

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Marquinhos era deputado quando enviou mensagens à vítima - Reprodução

Entre as mulheres que denunciaram o ex-prefeito Marquinhos Trad (PSD), candidato ao Governo de Mato Grosso do Sul, por assédio sexual, uma servidora pública alegou que as investidas do político teriam levado ao fim do relacionamento que ela tinha na época, em 2015.

Além disso, a mulher teria desenvolvido até doenças de fundo emocional com a situação. Segundo os relatos da vítima à delegada Maíra Pacheco, titular da DEAM (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) de Campo Grande, Marquinhos era deputado estadual na época e as investidas começaram 'do nada'.

De acordo com a mulher, o então deputado estadual passou a mandar recados no WhatsApp como se tivesse 'rolado' alguma coisa entre eles. O então namorado dela acabou vendo a conversa e o relacionamento não resistiu. Muitas mulheres, inclusive, deixam de denunciar assédios por medo da reação e julgamento por parte dos parceiros.

Em trecho da conversa, que foi entregue à Polícia Civil para perícia, supostamente o então deputado afirma que mandava mensagens porque 'teve sentimento'. A invertida com a resposta da mulher seria vexatória até para adolescentes: "Mas como teve sentimento se nos vimos apenas uma vez?".

Ela conta que depois das denúncias e notícias sobre os casos de assédio sexual envolvendo o candidato ao Governo do Estado Marquinhos Trad (PSD), criou coragem para relatar o que passou. Na época, ela recebia inúmeras mensagens do parlamentar e o fato acabou refletindo no relacionamento que a vítima tinha com outro servidor.

O depoimento, a que o Midiamax teve acesso, foi feito em uma delegacia de Campo Grande, no fim de julho. A vítima contou que foi orientada a procurar tal delegacia após entrar em contato pelo telefone, no canal direto disponibilizado pela Polícia Civil.

Segundo a servidora pública, os problemas dela começaram em janeiro de 2015, quando teve o primeiro contato com Marquinhos.

Naquela época, ela foi até a ALMS (Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul) acompanhada de um colega, para conversar com o então deputado sobre uma reivindicação da categoria.

Marquinhos recebeu os servidores demonstrou interesse em colaborar com a causa.

Ao fim da conversa, o colega da vítima saiu da sala e, quando ela foi sair, o deputado pediu o telefone para dar retorno sobre a solicitação feita, então ela passou. Depois, foi abraçada e beijada no rosto por Marquinhos, o que causou estranheza à vítima.

“Teve a impressão que ele quis ser íntimo”, consta na peça.

Teve medo de denunciar o caso na época

A servidora não chegou a procurar superior ou mesmo a polícia para denunciar o caso na época, porque alega que pensou ser um caso isolado ou que tivesse interpretado mal, porque achou estranho o comportamento incomum de um membro do legislativo. Ela também temia que, se denunciasse, poderia atrapalhar o apoio que pediu ao deputado e que iria beneficiar toda a classe em que ela atuava.

“Seria apenas uma fala diante de um agente público e que tinha influência política e na sociedade”, diz trecho do depoimento da vítima. Porém, a partir daí a servidora não teve mais sossego e passou a receber inúmeras mensagens do deputado. Marquinhos a abordava inicialmente falando do trabalho, mas depois dizia que pensava na vítima.

Mesmo só tendo visto a servidora uma vez, ele dizia que tinha sentimentos pela mulher. As mensagens passaram a ter conteúdo íntimo por parte do deputado e, conforme prints apresentados na delegacia pela vítima, ela respondia com negativa às investidas de Marquinhos.

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Mensagem enviada para a vítima - Reprodução

Apesar disso, o ex-namorado da vítima, que também é servidor público, acabou vendo as mensagens e teria desacreditado da mulher, imaginando que ela teria dado alguma liberdade ao parlamentar. A vítima acabou descredibilizada pelo companheiro e o relacionamento entre os dois terminou naquela época.

A vítima chegou a relatar por mensagem a Marquinhos que ele teria destruído o relacionamento. O que é dito no depoimento é que o relacionamento na época foi rompido pela abordagem e importunação de Marquinhos Trad. O nome do namorado não foi citado pela vítima no depoimento.

Além disso, a servidora desistiu de procurar apoio com outros parlamentares na época, porque “tomou nojo e repulsa da forma como foi tratada”.

Com o tempo, Marquinhos deixou de mandar mensagens para a vítima, que pelo abalo emocional acabou desenvolvendo uma doença autoimune, além de crises de ansiedade.

O depoimento compõe o inquérito policial que tramita na Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) e apura crimes de assédio sexual supostamente cometidos por Marquinhos Trad. Mais de 12 mulheres já procuraram a polícia e contaram sobre os abusos que sofreram por parte do parlamentar.

O Midiamax conversou com pessoa ligada à vítima. Segundo ela, mesmo passados 7 anos, a servidora segue amedrontada. O medo se deve ao fato do poder exercido pelo atual candidato. Mesmo assim, ela teria procurado a polícia ao se sentir encorajada vendo outras vítimas contando os assédios que sofreram e expondo o caso.

Marquinhos diz que tudo é 'armação eleitoral'

O candidato a governador do PSD foi denunciado por mais de dez mulheres, sempre por conduta sexual inadequada. Embora admita adultério com duas das denunciantes, Marquinhos nega os crimes sexuais e afirma que tudo seria parte de uma 'armação eleitoral'.

Segundo Trad, após defender indígenas e criticar ação policial em Amambai que virou conflito e terminou com uma morte, ele teria se tornado alvo de retaliação por parte do secretário estadual de Segurança Pública, Carlos Videira. Os dois trocaram farpas por WhatsApp e Marquinhos denunciou o suposto esquema para prejudicar a campanha eleitoral dele ao MPF.

Videira nega que tenha ameaçado Marquinhos e também que teria 'jogado na cara' suposta operação para abafar a denúncia e 'salvar' Trad num caso de 2018 envolvendo uma menor aprendiz que trabalhava na Prefeitura de Campo Grande, e acabou mesmo arquivado.

Operação apreendeu computadores da prefeitura

No dia 9 de agosto, a Prefeitura de Campo Grande foi alvo de operação policial e cumprimento de mandado de busca e apreensão, no âmbito da investigação sobre as denúncias de assédio contra Marquinhos. Dois computadores foram apreendidos e perícia também foi feita no gabinete, conforme apurado pelo Midiamax.

A intenção, segundo relatado por pessoas ligadas à investigação, seria de apurar os detalhes da sala e também do banheiro onde teriam ocorrido os crimes, conforme os relatos feitos pelas vítimas, o que comprovaria que ali estiveram.

Em nota, a prefeitura e também o ex-prefeito citaram um ‘espetáculo midiático’ feito pela polícia. Conforme a delegada Maíra Pacheco, da Deam, os servidores foram impedidos de terem acesso ao prédio no momento da operação, porque era feita perícia no local.

Além disso, toda a ação foi acompanhada por um procurador jurídico do município, que o tempo todo esteve presente na diligência.

Mandado foi cumprido

Os policiais civis foram até o 1º andar, onde fica o setor de finanças, e no 2º andar, onde está o gabinete uma vez ocupado pelo então prefeito Marquinhos Trad. Durante a ação, pelo menos 50 funcionários do município ficaram fora do prédio da Prefeitura em razão dos trabalhos feitos pela Polícia Civil, que impediu a entrada dos servidores.

A Polícia Civil instaurou inquérito policial para apurar os casos no último dia 5 de julho, mas a ocorrência é de 2020. O inquérito policial trata dos crimes de estupro, favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual, assédio sexual, importunação sexual, perseguição, posse sexual mediante fraude e vias de fato.

Denúncias de assédio sexual

Após o primeiro registro feito por uma das vítimas, na Corregedoria da Polícia Civil, no mês passado, outras mulheres procuraram a Deam para fazer denúncias de assédio. Em coletiva no dia 26 de julho, a delegada do caso, Maíra Pacheco, afirmou que a informação de suposto pagamento feito às mulheres para registrarem denúncias não consta no inquérito.

No entanto, conforme a delegada tudo seria investigado e caso seja provado que as mulheres tenham recebido dinheiro, elas podem responder por falso testemunho. O crime tem pena de 2 a 4 anos, além de multa.

“Mas, não diminui outras denúncias das outras vítimas que procuraram a delegacia”, disse Maíra Pacheco. Ainda segundo a delegada, sobre as denúncias de assédio sexual, em “crimes como esse, a única materialidade são os relatos das vítimas. Temos de ter respeito em um país patriarcal”.

Na época, a delegada ainda explicou que outras pessoas estavam sendo investigadas, mas não revelou por quais crimes e nem a quantidade de suspeitos. Não existe ainda previsão de quando Marquinhos Trad deve ser ouvido pela polícia.

Renata Portela

MIDIAMAX