Senadores de MS adotam cautela sobre colega flagrado com dinheiro na cueca
Simone Tebet (MDB) não comentou o afastamento, Soraya (PSL) preferiu não julgar, e Nelson Trad Filho (PSD) se limitou a dizer que o caso é grave
Flávio Veras
Nenhum dos senadores de Mato Grosso do Sul informou como votará quando o parlamento analisar os pedidos de prisão e afastamento do colega deles, o senador Chico Rodrigues (DEM-RR), flagrado com dinheiro na cueca, entre as nádegas, na quarta-feira (14).
Enquanto Nelson Trad Filho (PSD) considera o caso grave, a senadora Soraya Thronicke disse que não emitiria nenhum juízo de valor antes de conhecer o caso. Já Simone Tebet foi procurada pelo Correio do Estado, mas não se manifestou sobre o assunto.
A operação da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Polícia Federal buscou desmantelar um esquema milionário de desvio de recursos públicos que deveriam ter ido para o combate ao coronavírus. O suposto desvio seria de mais de R$ 20 milhões em emendas parlamentares.
Na quinta-feira (15), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso determinou que o parlamentar seja afastado do cargo por 90 dias, medida que já está em vigor. Agora o Senado decidirá se mantém ou não a decisão de Barroso.
Sobre essa determinação do ministro do STF, o senador Nelson Trad explicou que ele apenas provocou a casa sobre a situação de Rodrigues, pois desde 2017, no caso do ex-senador Delcídio do Amaral, o pleno do STF decidiu que qualquer afastamento ou cassação de mandato deve ser feito pelo Congresso Nacional.
“O caso parece grave, pois se o dinheiro encontrado com ele não fosse de origem ilícita, não teria motivo para tentar esconder o montante daquela forma deplorável. Outro fato que joga em desfavor a Rodrigues é o posicionamento do ministro Barroso. Eu não olhei os autos e as provas, mas o ministro não autorizaria a investigação, muito menos demandaria o afastamento, sem indícios muito fortes. Porém, agora cabe somente ao Senado, por meio do Conselho de Ética, decidir ou não pelo afastamento do parlamentar”, analisou Trad Filho.
O senador sul-mato-grossense, contudo, disse que não poderia afirmar se é a favor ou contrário a alguma sanção contra Rodrigues. “Eu, como médico, não posso afirmar que você está com hepatite apenas te vendo uma só vez, sem algum tipo de exame clínico ou laboratorial. O mesmo se aplica quando recebemos essa enxurrada de informações, pois não podemos condenar ninguém sem antes analisar o caso como um todo”, explicou.
A senadora Soraya Thronicke também foi comedida na análise sobre o caso. Para ela trata-se de algo muito recente e, como operadora do Direito, não pode se basear pelas notícias que estão sendo veiculadas sobre Chico Rodrigues.
“Como operadora, me sinto na obrigação de analisar todo o procedimento, e em atenção aos princípios do contraditório e da ampla defesa, que são direitos de todos os cidadãos. Também pretendo analisar a resposta do Senador, além das provas, antes de emitir qualquer juízo de valor, por mais que eu já esteja atenta ao que a mídia vem veiculando a respeito dos fatos”, explicou a senadora.
ESPECIALISTA
Sobre a decisão monocrática do ministro Barroso, Sandro Oliveira, doutor em Direito Constitucional pela PUC de São Paulo e professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (Fadir-UFMS), explicou que essa prerrogativa é válida, pois um poder pode interferir ou provocar o outro, desde que não ultrapasse os limites constitucionais.
Porém, ao ler o despacho do ministro, estranhou que o pedido de afastamento partiu da delegada responsável pela operação, algo que ele nunca havia presenciado.“Um delegado pode pedir uma prisão preventiva, por exemplo, mas eu nunca havia visto solicitar afastamento cautelar. É preciso entender que vige no Brasil um sistema de freios e contrapesos, onde cada um dos poderes da República pode, a depender do caso concreto, regular as atividades de outro, mas nos limites da Constituição Federal. Neste caso em especial, o que chama atenção inicialmente é que o pedido de afastamento da atividade parlamentar foi feito pela autoridade policial, delegada de Polícia Federal, e não pela Procuradoria-Geral da República [PGR] e nem manifestada por ela”, frisou.
Em relação ao prazo de afastamento do parlamentar por 90 dias, solicitado por Barroso, Oliveira afirmou que no processo não existe a fundamentação para esta determinação.
“Não identifiquei na decisão a fundamentação para o afastamento das funções por esse período. Pelo que consta na decisão liminar, o prazo parece ser uma opção pessoal do julgador, pois, repito, não houve fundamentação da escolha desse período. Me parece que diante dos fatos inusitados, dinheiro escondido nas partes íntimas, e não podendo decretar prisão, Barroso quis de alguma forma dar uma resposta aplicando, na impossibilidade de prisão, afastamento cautelar, que friso, não tem previsão constitucional”, explica.
Sobre a provocação para que o Senado julgue pelo afastamento ou não de Rodrigues, Oliveira afirmou que o trâmite é natural neste tipo de processo. “A remessa ao Senado é necessária em razão de ordem dada pela Constituição; não é uma opção, mas um dever. Nesse envio ao Senado, a casa, em cumprimento à Constituição, poderá rever, suspender a medida liminar. Tenho a impressão de que o Senado irá derrubar a liminar para, num segundo momento, resolver interna corporis [dentro do plenário]”.
CONSELHO ESTAGNADO
O Conselho de Ética está sem atividades desde março, assim como a maioria das comissões do Congresso, em razão da pandemia. O colegiado foi instalado em setembro do ano passado, com sete meses de atraso. Desde então, não promoveu nenhuma reunião para análise de pedidos de cassação.
A única sessão do conselho, nesta legislatura, de Alcolumbre, foi a de instalação e eleição de seu presidente, Jayme Campos (DEM-MT), e vice, Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), que atualmente está de licença.
O Conselho de Ética é formado por 15 senadores titulares mais 15 suplentes. As punições que podem ser aplicadas são advertência, censura e perda temporária e definitiva do mandato. Caso o colegiado vote pela perda do mandato de um senador, esse pedido ainda precisa passar pelo plenário. A cassação só é autorizada se pelo menos 41 parlamentares votarem a favor. A votação em plenário é secreta.
Apesar de não estar funcionando regularmente, há prerrogativa para que as comissões promovam deliberações. Na próxima semana, por exemplo, o Senado fará um esforço concentrado, com votação presencial pelos colegiados e pelo plenário principal, para escolha de autoridades.
INVESTIGAÇÃO
A ação da PGR e da Polícia Federal buscou desmantelar um esquema milionário de desvio de recursos públicos que deveriam ter ido para o combate ao novo coronavírus. O suposto desvio seria de mais de R$ 20 milhões em emendas parlamentares.
A Polícia Federal afirmou ao STF ter indícios de que Chico Rodrigues cometeu crime de lavagem de dinheiro e de obstrução da investigação de organização criminosa.
Após a divulgação dos fatos da investigação, o presidente Jair Bolsonaro retirou o senador da vice-liderança do governo na Casa. O parlamentar do DEM postou na quinta (15) um vídeo em que afirma que deixou a vaga de vice-líder do governo para “aclarar os fatos e trazer à tona a verdade”. Ele não comentou a decisão de Barroso.
“Acredito na verdade. Estou confiante na Justiça e digo que logo tudo será esclarecido e provarei que nada tenho a ver com qualquer ato ilícito de qualquer natureza. Vou cuidar da minha defesa e provar minha inocência”, disse. Rodrigues encerrou o vídeo dizendo que “Deus não dorme”.
CORREIO DO ESTADO