SEM FOCO: Pautas de MS ficam de lado e deputados focam temas nacionais
Com discussões focadas em torno de temas nacionais, sem relevância direta a Mato Grosso do Sul, e projetos cada vez menos fundamentados, as sessões legislativas não têm atingido o propósito a que se destinam. Quando não estão tratando de temas como Amazônia ou Lava Jato, os deputados estaduais têm usado a estrutura de seus gabinetes para apresentar projetos que acabam vetados pelo Executivo estadual – por vício de constitucionalidade ou de iniciativa. Fatos que ocorrem em Mato Grosso do Sul têm pouco espaço na Casa.
As reuniões parlamentares ocorrem todas as terças, quartas e quintas-feiras na Assembleia Legislativa, mas as primeiras horas são sempre recheadas de debates calorosos, na maioria das vezes apenas com trocas mútuas de críticas. É quando um deputado costuma ataca o outro ao defender suas ideologias em questões que, geralmente, são de assuntos nacionais e até internacionais – sem reflexo direto ou relevante para o Estado.
Exemplo disso ocorreu nas sessões de terça (27) e quarta-feira (28), quando deputados usaram a tribuna para reclamar da atuação e defender o presidente da República, Jair Messias Bolsonaro (PSL), em relação às queimadas na Amazônia e o reflexo das declarações relativas ao assunto na imprensa internacional.
Só depois de quase uma hora debatendo ideologias políticas – isso porque o tema principal, que era o fogo na Amazônia, já tinha saído de pauta – é que os deputados começaram a ordem do dia, momento em que são apresentados os projetos.
O 1° vice-presidente da Casa, Eduardo Rocha (MDB), confirma os desentendimentos, mas minimiza o problema. “O deputado Pedro Kemp [PT] levantou esse assunto [queimadas] na terça-feira e foi contestado pelo Coronel Davi e Capitão Contar. Na quarta-feira, ele levou slides mostrando dados. Virou discussão. Mas cada um trata do assunto que quer, seja regional ou nacional, e tem sua liberdade”.
A respeito das queimadas terem dominado as sessões, o parlamentar também se mostrou preocupado. “Tem relação com o Estado, sim. O pano de fundo é porque corre o risco de haver embargos a produtos nacionais. Mato Grosso do Sul é campeão na exportação de soja e couro. O Pantanal também tem esse problema, é preocupante”, disse Rocha.
SEM IMPORTÂNCIA
Além das rusgas, projetos inócuos são apresentados, um atrás do outro. Durante o mês de agosto, a lista de propostas apresentadas pelos parlamentares e que provavelmente não serão sancionadas é imensa.
Mas, caso sejam sancionadas, as legislações aprovadas ali, em meio a muita confusão, podem acabar não sendo efetivadas. Este é o caso do cadastro de pedófilos, aprovado em 2017 e que até o momento não foi colocado em prática.
Caso mais recente ocorreu na segunda semana de agosto, quando o deputado Jamilson Name (PDT) apresentou proposta, que já foi aprovada na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR), para que produto chamado bórax – usado para confecção de slimes, que tem sido alegria da garotada – tenha venda proibida em farmácias, sob a justificativa de o produto ser tóxico.Porém, existe questionamento sobre o vício de iniciativa.
Na terça-feira (27), outros dois projetos que fizeram parte da pauta do dia foram a obrigatoriedade de hospitais da rede pública e privada de disponibilizarem ambulância para o transporte de pacientes, contudo, o serviço já é oferecido pelos locais. “Isso já acontece, os hospitais fazem esse trasporte. Isso é normal, os hospitais têm que ter o veículo”, reforçou a médica socorrista do Samu, Maitê Galhardo.
E mais cadastros foram aprovados. De autoria do deputado João Henrique Catan (PL), dessa vez os parlamentares aprovaram a criação do Cadastro Estadual de Pessoas com Deficiência, denominado Cadastro-Inclusão, matéria que deveria ser desenvolvida pela Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Assistência Social e Trabalho (Sedhast).
Na quarta-feira (28), a ineficiência dos projetos apresentados se comprovou. Após ser alertado pelo líder do governo na Casa – deputado José Carlos Barbosa (DEM), o Barbosinha –, Lídio Lopes (Patri) acabou cedendo e tirando da pauta o projeto que prevê isenção de pedágios para moradores do município de Ladário. Por envolver renúncia de receita, o projeto já nasceu com vício de iniciativa – só poderia ser proposto pelo próprio Executivo. Agora, Lopes deverá arquivar o projeto.
O fechamento da semana, com chave de ouro, foi a aprovação do projeto de Neno Razuk (PTB) para criar farmácia veterinária popular. Outra matéria que gera ônus para o Estado e que segue para sanção do governador.
“A Casa cumpre o seu regimento. Os projetos passam pela CCJ para avaliar a constitucionalidade e depois vai ao plenário, quando tem, pelo menos, um voto a favor. Se forem unânimes contra ele, nem segue; já é arquivado. Mas pode acontecer de o projeto ser inconstitucional. A CCJ não é absoluta. Se houver veto, o autor é quem defende e podemos votar para derrubar ou não”, concluiu Rocha.
ESTÁ NA LEI
O regimento interno da Assembleia prevê que os projetos apresentados pelos deputados devem ser “matérias de exclusiva competência do Poder Legislativo” que não sejam da competência reservada ao Executivo (resolução n° 65/2008).
Por NATALIA YAHN E IZABELA JORNADA
Foto: Luciana Nassar / ALMS
CORREIO DO ESTADO