Secretários de Fazenda criticam reforma tributária de Paulo Guedes

13/08/2020 07h43 - Atualizado há 4 anos
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Reprodução TV Senado

Secretários estaduais de Fazenda criticaram nesta quarta-feira (12) a proposta de reforma tributária enviada à Câmara dos Deputados pelo Poder Executivo. O PL 3.887/2020, entregue em julho pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, acaba com o Programa de Integração Social (PIS) e com a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para criar a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%.

Os secretários participaram de uma audiência pública remota da Comissão Mista da Reforma Tributária. O debate contou com a presença do presidente do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda (Comsefaz), Rafael Fonteles, e de representantes das cinco regiões do país. O secretário da Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha, defendeu uma reforma “mais ampla” do que a apresentada pelo Palácio do Planalto.

— Olhar a proposta de forma parcelada pode trazer algum percalço, em vez de uma aceleração na tramitação. Essa questão fatiada e em regime de urgência nos preocupa muito porque a gente está diante de alguns dilemas. Como vai se analisar isoladamente a CBS? Ela não é só a fusão de PIS e Cofins. Ela tem um olhar de mais amplitude, com avanço de base tributária. A gente não está participando da CBS. É uma solução para o governo federal. Um imposto amplo é a verdadeira reforma tributária que o país precisa porque cria harmonização — defendeu.

O secretário da Fazenda do Mato Grosso, Rogério Gallo, também demonstrou resistência à proposta do Poder Executivo. Ele destacou que o projeto apresentado pelo ministro Paulo Guedes deixa de fora da reforma os impostos sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e sobre Serviços (ISS).

— Isso nos preocupa porque manteríamos tributos da União e dos estados sobre o consumo, mas teríamos um outro tributo sobre serviços com os municípios. Isso traria problemas de cumulatividade. A indústria consume serviços, mas não poderia aproveitar os créditos. A mesma coisa ocorreria com aqueles prestam serviços: não poderiam aproveitar-se dos créditos. Para que tenhamos uma tributação racional sobre o consumo, defendemos uma proposta de fato abrangente: um imposto sobre valor agregado amplo, com base ampla. Sem muitas exceções, para que tenhamos de fato uma simplificação — afirmou.

O secretário da Fazenda de São Paulo, Henrique Meirelles, alertou para a “complexidade tributária” do Brasil. Segundo ele, a burocracia enfrentada pelas empresas para apenas conseguir descobrir quais impostos pagar consome em média 2,6 mil horas por ano. Ele também cobrou uma reforma mais abrangente.

— Esse fatiamento é negativo para o país. É necessária uma reforma única e ampla. A ideia é fazer uma reforma que simplifique todo o processo. A maior complexidade do sistema tributário brasileiro é o ICMS. São diversos setores em cada estado com alíquotas diferentes. A complexidade é enorme. A motivação inicial da reforma tributaria é dar mais competitividade ao Brasil e simplificar o processo. Para isso, é fundamental a reforma do ICMS — afirmou. 

Comsefaz

O presidente do Comsefaz, Rafael Fonteles, apresentou uma alternativa com base em duas propostas de emenda à Constituição que já tramitam na Câmara (PEC  45/2019) e no Senado (PEC 110/2019). O texto cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em substituição a cinco tributos: PIS, Cofins, ICMS, ISS e IPI.

Para Fonteles, o Brasil tem “o pior sistema do mundo sob qualquer critério”. Ele lembrou que o imposto único — adotado por União Europeia, Argentina, China, Uruguai, Canadá, Índia e Nova Zelândia — poderia promover simplificação, padronização, fim da guerra fiscal e manutenção da carga tributária no Brasil.

A proposta do Comsefaz prevê a criação de um comitê gestor do IBS com 49 membros, divididos entre estados e Distrito Federal (27 votos), União (14 votos) e municípios (8 votos). Qualquer decisão precisaria ser aprovada por dois terços dos membros, com o voto de pelo menos metade dos representantes de cada região do país.

— O comitê deve calcular alíquotas mínimas e máximas para evitar uma nova guerra fiscal e que a União avance sobre a base de consumo e acabe ficando com uma alíquota muito grande. Essa questão de ter alíquotas mínimas e máximas para os três entes e fundamental para a viabilidade desse sistema tributário — afirmou.

A proposta acaba com benefícios fiscais, com apenas duas exceções: a devolução de parcela dos tributos para populações de menor poder aquisitivo e a manutenção da Zona Franca de Manaus. Segundo Rafael Fonteles, o fim da guerra fiscal geraria um problema a ser resolvido: um mecanismo para atração de investimentos e indústrias em regiões menos desenvolvidas do país.

O Comsefaz propõe a criação de um fundo de desenvolvimento regional e compensação das exportações. Para a União, o fundo deveria ser formado pelas receitas do petróleo. Mas Rafael Fonteles sugere como fonte de financiamento as parcelas da União no IBS e no Imposto Seletivo (cobrado sobre cigarros e bebidas alcoólicas).

— Seriam R$ 485 bilhões até 2032. Os estados querem que essa fonte seja o tributo, e não as receitas de petróleo, que oscilam para mais ou menos. O ente da Federação que tem mais condição de suportar esse risco é a União, que pode se financiar com a emissão de títulos públicos. Estados e municípios não podem — afirmou.

A proposta prevê uma transição de oito anos do modelo atual para o IBS. Eventuais perdas com o novo sistema seriam compensadas pelos próprios estados.

— Não precisamos da União para compensar perdedores nesse modelo. A compensação é feita pelos próprios estados num prazo de 20 anos. A receita real é preservada a cada ano, e apenas o crescimento real é distribuído pelo destino. Quando chegar a 20 anos, a parte do crescimento será bem maior do que a parte original. A transição fica suave para esse novo modelo, sem nenhum sobressalto nas receitas dos entes subnacionais, mesmo para aqueles que perdem no princípio — disse.

Rafael Fonteles disse ainda a alíquota do imposto único no Brasil poder ser mais alta do que a de outros países. Mas ele considera isso “natural”.

— Somos o país que mais tributa o consumo. Então, é natural que a alíquota do IBS brasileiro seja a maior entre os países que usam o imposto sobre valor agregado. Isso não quer dizer aumento de carga tributaria. Pelo contrário: a calibragem garante que a carga tributária vai ser mantida. Não se deve assustar com alíquota maior ou menor. Ela apenas vai refletir o que é arrecadado hoje no Brasil — afirmou.

A comissão mista da reforma tributária foi criada em fevereiro para consolidar propostas de mudança constitucional sobre o tema. Formado por 25 senadores e 25 deputados, o colegiado deve encerrar os trabalhos até o dia 28 de agosto.

Fonte: Agência Senado