Promotora é flagrada reclamando de resultado nas urnas, que tenta cassar
Designada para Ladário está à frente de ação em Corumbá
Mesmo designada como promotora eleitoral em Ladário, Ana Rachel Borges de Figueiredo Nina, não escondeu o descontentamento com o resultado das eleições no município vizinho, Corumbá, onde é promotora de justiça. Flagrada em conversas de WhatsApp reclamando da vitória de Ruiter Cunha (PSDB), Ana Rachel Nina está à frente de representação que tenta cassar o resultado das urnas.
As conversas carregadas de opinião da promotora foram compartilhadas com um grupo de amigos que praticam atividades desportivas em Corumbá.
Os comentários da representante do Ministério Público emitindo juízo de valor sobre uma situação em que ela age oficialmente causou desconforto até entre membros do grupo, que resolveram printar os trechos e divulgar para a imprensa. Localmente ninguém publica mesmo, porque toda imprensa em Corumbá tem interesses envolvidos, diz o leitor que encaminhou o material para o Jornal Midiamax.
A reportagem entrou em contato com a promotora, que confirmou a autenticidade das conversas. Por telefone, Ana Rachel admitiu na manhã de sexta-feira (2) o diálogo no grupo de amigos do WhatsApp, com os quais mantém contato por motivos ligados ao esporte. Ela participa de competições de corridas de aventura.
A promotora contou que, durante a eleição deste ano, atuou como promotora eleitoral em Ladário, cidade vizinha de Corumbá. No entanto, confirma ter agido numa denúncia contra o prefeito eleito Ruiter Cunha. Trata-se de uma suspeita de compra de votos envolvendo Ruiter e o vereador eleito também do PSDB, Irailton Oliveira Santana. A promotora afirmou que o caso foi primeiro investigado pela Polícia Federal.
“Na ação do MPF consta o que a PF apurou. E se nada tiver contra o Ruiter, o caso será arquivado. Do contrário, o caso será denunciado”, disse. Segundo ela, como o caso não corre em segredo judicial, ela não cometeu erro algum com os comentários no WhatsApp.
Não é o que pensam eleitores de Ruiter. Quem enviou a denúncia ao jornal, por exemplo, diz que decidiu printar os diálogos porque achou duvidosa a postura de alguém que está diretamente envolvida numa ação eleitoral com tal grau de posicionamento parcial. Eles disseram que, pela leitura das conversas “perceberam” que Ana Rachel estaria tratando a eleição de Ruiter Cunha como um equívoco.
Nem me fale!
Num dos diálogos ao qual o jornal Midiamax teve acesso, logo no início, Ana Rachel conversa com uma pessoa que identifica-se como Cristiane, que pergunta a ela: Ruiter prefeito? [Ruiter Cunha, prefeito eleito de Corumbá]. Eita povo esquecido esses corumbaenses hein.
A promotora responde: Nem me fale [em seguida ela põe a imagem de dois macaquinhos com as mãos nos olhos, dando a entender que a expressão tem a ver com algo vergonhoso].
À reportagem, a promotora confirmou o diálogo. Mesmo assim, ela contesta a ideia de ter sido parcial nos comentários feitos acerca do resultado da eleição, em Corumbá. Participam da conversa diversos profissionais liberais e formadores de opinião em Corumbá, como pesquisadora, arquiteta, fisioterapeuta, servidora municipal, empresárias e desportistas.
Todo o diálogo gira em torno do resultado da eleição e possíveis fraudes ocorridas no pleito. Num dos trechos da conversa, depois de um comentário perplexo com a eleição de Ruiter, a promotora fez uma afiada ponderação.
Pura Verdade
Uma fisioterapeuta, conforme apurou a reportagem, diz: “Chego em Corumbá com essa triste notícia. Arrasada [referindo-se a eleição vitória de Ruiter sobre o atual prefeito Paulo Duarte, do PDT]”.
Ana Rachel retribui: “E é pq vcs não viram os vereadores ainda [põe de novo a imagem do macaquinho]. De Chorar gente”.
A conversa segue e a chiadeira quanto à vitória de Ruiter Cunha é cada vez mais frequente pelas amigas da promotora.
“Gente como que é??? Ruiter Ganhooou???”, anota uma pesquisadora. “Triste realidade” completa uma empresária. “Meu Deus”, “Eu to passada”, acrescentam outras amigas.
Mais à frente, a promotora entra na conversa, desta vez passando suposta informação sobre detalhes do trabalho na promotoria eleitoral, e admitindo que não teria provas dos supostos ilícitos: “Vcs não têm ideia do tanto de voto que foi comprado, todo mundo sabia, mas não pegamos, infelizmente”.
Depois, outra colega da promotora faz este comentário: “A educação desse país ser ruim é bom para eles. Muitos não têm discernimento, não acreditam na justiça e nas leis. Com exceção da Lava-Jato, os órgãos não divulgam o andamento dos feitos. Do Ruiter, por exemplo, ngm nem sabe o que ocorreu. Se foi denunciado ou não. O povo nem sabe o que é uma denúncia... Enfim, é o que temos”.
Ana Rachel, a promotora eleitoral, completa: “Pura verdade!”.
Não vamos deixar
Mais adiante, a promotora publica parte de reportagem dizendo que “Ação pede cassação de prefeito eleito e pode causar reviravolta em Corumbá”.
O material comove o grupo frequentado por Ana Rachel, que aplaude a notícia. Uma das amigas de Ana Rachel acrescenta: “Bom dia!! Que Deus abençoe vc Ana e que ilumine a justiça para q seja rápida e eficiente!!”.
“Não vamos deixar esse processo impune”, adiciona outra colega da promotora.
O assunto eleição segue dominando o diálogo, tanto que logo depois aparece nas conversar parte de reportagem que diz que o prefeito eleito “usou a TV boliviana para fazer campanha no país vizinho”.
Ana Rachel entra na conversa e diz: “E tem muito mais coisas hein”. Colega da promotora, a fisioterapeuta, diz: “Joga na roda aí”. A promotora responde com a imagem de um boneco cuja expressão remete ao silêncio.
O risco de falar muito
Outros casos com manifestações de opinião de promotores públicos levaram ao questionamento público de membros do Ministério Público.
Foi o que aconteceu em fevereiro deste ano, quando o promotor de justiça de São Paulo, Cássio Conserino, falou sobre o processo que investigava a propriedade de um tríplex supostamente do ex-presidente Luis Ignácio Lula da Silva antes mesmo de ouvir o investigado. Causou grande reação e quase foi afastado das investigações do PIC n° 94.2.7273/2015.
Em maio de 2014, o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) puniu um promotor por causa de manifestações dele no perfil pessoal do Facebook. O caso foi levado ao Supremo Tribunal Federal pelo membro do MP punido, mas o Ministro Dias Toffoli negou seguimento ao mandado de segurança 33410, que pedia a suspensão da punição.
Celso Bejarano - midiamax.com.br