Investigação no TCE mirou um, mas derrubou outros três conselheiros

15/05/2023 09h58 - Atualizado há 1 ano

Servidores da elite do funcionalismo público viraram foco da apuração de suspeitas de corrupção em 2015, na operação lama afáltica, da PF

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O conselheiro Osmar Jerônymo - divulgação

Investigação que escandalizou o TCE-MS (Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul), a partir de dezembro do ano passado, surgiu bem antes, perto de sete anos atrás, período que a Polícia Federal deflagrou a Lama Asfáltica, a maior operação de combate à corrupção com participação de políticos que se tem notícia em MS.

A investida policial ocorrera em julho de 2015. Num primeiro momento, o nome do conselheiro Osmar Domingues Jerônymo, era o foco da devassa.

No entanto, com o avanço da investigação nas contas públicas, o castigo atingiu três colegas de Osmar, não ele: os conselheiros Waldir Neves, Iran Coelho das Neves e Ronaldo Chadid.

Além de afastados dos cargos de dezembro para cá, já há cinco meses, por suspeitas de corrupção, o trio é monitorado pela Justiça por meio da tornozeleira eletrônica.

Embora saído incólume da decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que afastou os conselheiros, Osmar é investigado por suposto enriquecimento ilícito, contratação de servidores fantasmas e lavagem de dinheiro.

CONTEXTUALIZAÇÃO

Repare aqui a contextualização de trecho da denúncia da PGR (Procuradoria Geral da República), que sustentou o afastamento dos conselheiros, concordado pelo STJ.

Diz a denúncia, por exemplo, que Osmar teria participação na organização criminosa chefiada por João Amorim, empreiteiro investigado na Lama Asfática e que, segundo o MPF (Ministério Público Federal, era "sócio de fato da empresa CG SOLURB [empresa que cuida da coleta do lixo em Campo Grande]"

Completa o inquérito:

"É que, segundo apurado na “Operação Lama Asfáltica”, JOÃO AMORIM e outros, por intermédio da empresa CG SOLURB, possuem envolvimento em diversos atos de fraudes em procedimentos licitatórios, obras realizadas com superfaturamento e consequente desvios de recursos públicos".

CRUZAMENTOS

Pelo inquérito produzido, "em encontro fortuito, durante diligências de interceptação das comunicações telefônicas, surgiram elementos que indicavam que os referidos Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul possuíam envolvimento ilícito com a organização criminosa, o que motivou a instauração do apuratório".

Diz também a peça investigativa:

"No bojo da Medida Cautelar Inominada Criminal n. 21/DF, foi obtido o afastamento dos sigilos bancário, fiscal e telefônico dos investigados, face a robustos elementos de envolvimento daquelas autoridades".

Aqui, a partir da quebra dos sigilos, foi que os três conselheiros afastados se complicaram. Nesta etapa da investigação, contudo, Osmar Jerônymo ficou de fora.

"Em desdobramento das investigações, outrossim, passou-se a apurar irregularidades praticadas no âmbito do TCE/MS, que contou com o concurso dos Conselheiros investigados, relativamente à execução de contrato entre o Tribunal e a empresa DATAEASY CONSULTORIA E INFORMÁTICA".

Os conselheiros Waldir, Ronaldo e Iran, segundo as investigações, teriam desviados altas somas dos cofres do TCE por meio de fraudes na licitação que favoreceu a Dataeasy. Estima-se, segundo a denúncia da PGR, que a empresa de informática arrecadou em torno de R$ 102 milhões.

No inquérito, o nome de Jerônymo é citado desta maneira:

"Por sua vez, no INQ 1432, também instaurado em desdobramento da“Operação Lama Asfáltica”, investiga-se a prática, por parte de FÉLIX JAYME NUNES DA CUNHA, em conluio e no interesse do Conselheiro do TCE/MSm OSMAR DOMINGUES JERONYMO, de atos de lavagem de ativos".

ESQUEMA

Os inquéritos que continuarão em andamento no STJ, mesmo com os conselheiros afastados, permitem o prosseguimento da investigação do esquema de desvio de dinheiro do TCE-MS.

Conforme apurado pela PF na Operação Terceirização de Ouro, deflagrada ano passado, o esquema criminoso teria resultado em desvios dezenas de milhões de reais e agora o MPF quer que eles devolvam R$ 106 milhões.

Para que os envolvidos se apropriassem dos recursos, a empresa Dataeasy, que tinha um grande contrato de prestação de serviços, e também muito genérico, comandava o esquema. Era ela, por exemplo, que terceirizava supostos funcionários fantasmas do TCE-MS e que contratava serviços suspeitos.

Conforme apontou a investigação, a empresa servia de cabide de emprego (contratava com altos salários pessoas indicadas pelos conselheiros) e ainda era uma espécie de caixa paralelo dos envolvidos no esquema: foram descontados mais de R$ 9 milhões em cheques com destinação duvidosa e ainda declarados serviços comerciais prestados ao próprio Tribunal.

Para aumentar os indícios, a Dataeasy recebia por tarefas executadas, e não por número de funcionários. As tarefas são exatamente as mesmas realizadas por servidores de carreira.

Contratada em certame licitatório que durou apenas 29 dias (período mais curco que qualquer outras licitação no TCE), quando Waldir Neves presidia a Corte, a Dataeasy permaneceu prestando serviços até o ano passado, quando a operação da PF foi desencadeada. Essa continuidade é um dos motivos de o presidente da Corte à época, Iran Coelho das Neves, também ter sido enquadrado.

Um dos contratados pela Dataeasy, que na verdade nunca prestou serviço algum à empresa, é o primo de Waldir Neves, William das Neves Barbosa Yashimoto, considerado faz-tudo de Waldir.

“Constatou-se efetiva manipulação e fraude nos registros do e-TCE a fim de gerar produtividade falsa”, indicou o inquérito.

PARA QUE SERVE

O TCE deve custar neste ano aos cofres públicos, segundo o orçamento do Estado, R$ 357,7 milhões, ou seja, perto de R$ 1 milhão por dia.

O TCE só existe para fiscalizar os recursos que circulam em órgãos públicos de MS, como governo, prefeituras, câmara municipal e Assembleia Legislativa.

A média salarial, ao menos em dezembro passado, quando afastados, dos três conselheiros gira em em torno de R$ 130 mil a R$ 150 mil.

O TCE é integrado por sete conselheiros. Assumiram os lugares dos afastados auditores da corte fiscal.

Por determinação do STJ, Waldir, Ronaldo e Iran deveriam ficar afastados dos cargos por período 180 dias, ou seis meses, determinação cuja data expira na primeira quinzena de junho. (colaborou Eduardo Miranda).

CELSO BEJARANO

CORREIO DO ESTADO