"Tem criança que ela bate porque não vai com a cara", diz cuidadora presa sobre dona de creche
“Olha, tem criança que ela bate porque ela diz que não vai com a cara, por exemplo, tem o G* que eu cuido dele a noite, na minha casa, e um dia sim e outro não ele vai lá para a creche. A Caroline fala que não suporta a cara dele, e teve um dia, não sei falar o dia certo, ela deu uns tapas nele. Ela falou que estava batendo porque ele era feio e ela não suportava a cara feia dele”.
O relato acima é do depoimento de Mariana, 26, funcionária de Caroline Florenciano dos Reis Rech, 30 na creche Cantinho da Tia Carol e detida junto dela na manhã de terça-feira (11/7) durante ação da Polícia Civil em Naviraí.
Ela pagou fiança arbitrada em R$ 1.320 para responder ao processo em liberdade, enquanto a proprietária do estabelecimento permanece presa e deve ser encaminhada a penitenciária nas próximas horas.
Ambas são acusadas de dopar e cometer maus-tratos contra crianças que estavam matriculadas no local.
Em relato à delegada Sayara Quinteiro Martins Baetz, da DAM (Delegacia de Atendimento à Mulher) de Naviraí horas depois da prisão, Mariane negou ter cometido qualquer agressão contra crianças e disse não ter deixado o emprego ou denunciado por medo e com receio do que poderia acontecer com os menores.
A jovem disse que iniciou os trabalhos no local há quatro meses e que o comportamento violento de Caroline começou a ser exposto recentemente.
“No começo, quando comecei a trabalhar lá, ela não era tão violenta com as crianças, ela parecia ser calma, mas acho que depois ela foi se sentindo mais à vontade comigo e daí que ela começou a judiar das crianças na minha frente”, afirmou em depoimento.
Questionada sobre outras agressões, Mariana disse já ter presenciado tapas e beliscões em outras crianças. “Um dia ela deu um tapa na boca da A e saiu sangue. Na hora eu fingi que não vi (...) Disfarcei e perguntei pra Carol porque a boca da A estava sangrando, ela ficou sem graça e falou que achava que era a unha dela que tinha pegado na boca da bebê”.
A funcionária da creche confirmou ter ministrado medicação para alguns menores, segundo ela, a pedido de Caroline há aproximadamente três meses. O remédio era dado sempre pela manhã.
*Os nomes dos menores foram omitidos para que não sejam expostos.
‘Ferrada’
Caroline Florenciano teve a prisão em flagrante convertida em preventiva e disse que em liberdade ou dentro de um presídio, ‘estará ferrada’, segundo depoimento dado por ela na DAM de Naviraí.
“A declarante se altera e diz que não falará nada. Expressa grande nervosismo, grita e afirma que tudo o que foi presenciado nas câmeras é verdade, que ela errou, no entanto, não ministrou nenhum tipo de remédio em crianças e nem mandou ministrar. Diz que irá se matar, porque se ela for liberta ou for para o presídio (sic), estará ferrada”, diz trecho do termo de qualificação e interrogatório do auto de prisão que o Dourados News teve acesso.
Há quatro anos, a acusada contou ter iniciado no cuidado de crianças e chegou a ter 22 menores na casa onde mora. Em janeiro desse ano ela alugou o espaço onde funcionava até a terça-feira (11/7) a creche denominada Cantinho da Tia Carol, no bairro Sol Nascente.
Sonolência, sede e fome
Mães que prestaram depoimento à delegada Sayara Quinteiro Martins Baetz, relataram praticamente a mesma forma como os filhos costumavam chegar em casa após horas na creche.
Nas conversas, boa parte cita os filhos chegando sonolentos – provavelmente por conta da medicação -, com muita fome e sede.
Uma das testemunhas, de 30 anos, disse ainda ter percebido mudança no comportamento do filho há aproximadamente três semanas. O menino, de um ano e 10 meses passou a não querer mais ir à creche.
Em caso recente, o menor chegou com a boca inchada, porém, ao ser questionada pela mãe se ele havia caído, Caroline negou e disse que poderia ter sido uma ‘mordida na língua’.
O caso mais grave ocorreu com uma bebê de 11 meses. Ela foi flagrada na manhã de ontem (11/7) sendo torturada pela mulher.
Além disso, relatos de outras crianças que presenciaram a cena e de Mariana, apontam que as agressões ocorriam de forma constante.
Outras testemunhas relataram que além dessas situações, alguns menores passavam por constrangimento. Como no caso de dois meninos que urinaram na roupa, foram repreendidos e chamados pelos outros colegas – a mando de Caroline - de ‘mijões’.
Essa situação foi relatada pelas próprias crianças ao serem questionadas pelos pais sobre o que acontecia dentro da creche.
O caso
Conforme mostrado na terça-feira pelo Dourados News, policiais civis da DAM de Naviraí prenderam Caroline e Mariana após relatos de maus-tratos na creche Cantinho da Tia Carol. O lugar funcionava de forma clandestina e a suspeita apontava para agressões física, moral e psicológica nos menores, que ainda eram dopados com medicamentos que causam sonolência.
Diante da denúncia, a polícia conseguiu autorização judicial para instalar equipamentos de captura de áudio e vídeo. Durante duas horas de investigação, foi possível presenciar as cenas chocantes, conforme relatado pelos policiais.
Dopadas
Conforme os policiais, as crianças eram dopadas com medicamento para vômitos e enjoos, proibido para menores de 2 anos e que tem como um dos efeitos a sonolência para que parassem de chorar e dormir.
Além disso, durante acompanhamento das filmagens, os policiais disseram ter presenciado a proprietária do estabelecimento, que também era cuidadora, batendo a cabeça de uma criança de 11 meses contra o sofá, chacoalhando e jogando outra criança no colchão, dando tapas, gritando, entre outras ações.
Por Adriano Moretto
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