Prefeitura de Campo Grande esconde documentos sobre novo aterro sanitário
Solicitação foi feita no dia 21 de setembro, por meio da Lei de Acesso à Informação, e até então não houve resposta
Há 57 dias, a Prefeitura de Campo Grande ignora um pedido feito pelo Correio do Estado para ter acesso aos documentos do processo de implantação do novo aterro sanitário da Capital. A solicitação foi feita por meio da Lei nº 12.527, de 2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação, que dá 30 dias para os órgãos públicos encaminharem resposta.
O pedido foi feito para a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Gestão Urbana (Semadur) no dia 21 de setembro desde ano, Pasta que cuida do processo de implantação do novo aterro, que ainda não começou a ser feito.
De acordo com o ofício, o Correio do Estado solicitou “cópia integral do Processo Administrativo nº 33686/2020-32, aguardando-se a comunicação ao signatário […] sobre o local, a data e o modo para se realizar reprodução dos autos e/ou receber as cópias solicitadas, no prazo legal”.
Até hoje, porém, não houve resposta por parte da prefeitura do processo que, em tese, deveria ser público e constar na transparência desta administração pública.
Segundo o professor de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) Sandro Oliveira, doutor em Direito Constitucional, o gestor que desrespeitar a lei pode, em alguns casos, até responder por improbidade administrativa.
“A responsabilidade pela recusa do fornecimento de informações que não estejam protegidas por sigilo é pessoal do agente público ou militar, devendo ele responder administrativamente pela recusa, podendo responder, a depender do caso concreto, por improbidade administrativa”, explicou o especialista.
Ainda de acordo com Oliveira, a Lei de Acesso à Informação (LAI) “é um marco civilizatório e manifestação direta do princípio fundamental da cidadania. O agente público que detém a informação objeto de requerimento de acesso não presta um favor ao disponibilizar o conteúdo, ele tem o dever legal de fazê-lo, sempre ressaltando a preservação daquilo está sob sigilo, segundo critério da própria lei”, completa.
O vereador Professor André Luis (Rede) lamentou o fato de a prefeitura não cumprir com uma lei existente há 11 anos. “A prefeitura deveria ter essas informações no Portal da Transparência de forma muito mais ampla que é disponibilizada hoje. Deveria disponibilizar todo e qualquer informações acerca de processos”, declarou.
“Apenas as informações sobre o estado de defesa da União e tudo que se diz respeito à segurança nacional são confidenciais, todo o resto deve ser disponibilizado para a população”, completou o vereador.
Segundo o parlamentar, o mesmo ocorreu com ele, só que o tema a que ele pediu acesso foi o Programa de Inclusão Profissional (Proinc). “Aconteceu comigo na questão do Proinc, fiz um ofício à prefeitura, não me responderam, então retifiquei à gestão, e, como não obtive resposta novamente, tive de propor um mandado de segurança”, contou.
Por meio da Justiça, ainda conforme André Luis, ele teve ganho de causa, mas ainda espera receber os dados solicitados. “Teve definição favorável, e só estou esperando o trânsito em julgado para ter acesso aos documentos. Mas é lamentável que em pleno 2022 a gente ainda tenha dificuldade de acesso a informações que deveriam ser públicas”.
Conforme o professor da UFMS, a discussão sobre o acesso a informações públicas se iniciou nos primeiros anos deste século e foi um desdobramento do princípio da publicidade dos atos da administração pública, previsto na Constituição Federal.
“Este princípio, publicidade, é muito genérico, além da necessidade de regulamentação da matéria, um fato externo acabou contribuindo para o debate subir à categoria de um hot topic. Esse fato foi a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que condenou, em 2010, o Brasil pela ausência de informação quanto ao paradeiro dos desaparecidos políticos no caso Gomes Lund e outros da República Federativa do Brasil. No ano seguinte, o Parlamento brasileiro aprovou projeto de lei, sancionado no mesmo ano, entrando em vigor em 2012”, frisou.
A Lei 12.527/2011 alcança todos os entes da Federação: União, estados, municípios e distrito federal.
ATERRO
Enquanto as obras para o novo aterro sanitário não ficam prontas, Campo Grande segue utilizando o aterro Dom Antônio Barbosa 2, localizado próximo ao antigo lixão, onde, inclusive, deve ser construído o novo espaço para destinação dos resíduos.
Dados de uma audiência pública realizada na Câmara Municipal, no ano passado, mostram que a vida útil do aterro venceu em junho de 2021, portanto, há um ano e meio, o local funciona provisoriamente porque o novo aterro ainda não obteve todas as licenças para o início da construção.
O aterro, batizado de Ereguaçu, será implementado na MS-455, na estrada da Gameleira, próximo ao local onde funcionou por muitos anos o lixão de Campo Grande, no Dom Antônio Barbosa.
Além de Campo Grande, o Dom Antônio Barbosa 2 atende também os municípios de Terenos, Rio Negro, Rochedo, Bandeirantes, Corguinho, Jaraguari, Figueirão e São Gabriel do Oeste.
IRREGULARIDADES
Durante a gestão do prefeito Nelson Trad (PSD), em 2012, o contrato da prefeitura da Capital com a CG Solurb, concessionária de coleta e destinação de resíduos de Campo Grande, chegou a ser judicializado após denúncias de superfaturamento e corrupção.
Uma das principais irregularidades apontadas foi referente à impermeabilização do terreno do aterro sanitário. Em vistoria, ainda em 2012, a Polícia Federal captou imagens que mostraram a inferioridade do material das mantas que protegem o solo.
Conforme preconizado pelo estudo de impacto ambiental, seria necessário o uso de mantas com dois milímetros de espessura, diferentemente do material instalado, que variou de 1 a 1,5 milímetro.
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) propôs uma Ação Civil Pública (ACP) expondo, além do superfaturamento, a existência do direcionamento na licitação, haja vista que foi constatado o compromisso de compra e venda de 50 hectares onde o aterro Ereguaçu deveria ser implementado.
Com a avaliação procedente, o juiz de direito David de Oliveira Gomes Filho chegou a anular o contrato da prefeitura com a Solurb. No entanto, a concessionária recorreu alegando que a medida resultaria na demissão em massa de 935 funcionários.
Por essa razão, em maio de 2021, o desembargador Vilson Bertelli, da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), aceitou o pedido da Solurb e suspendeu o cancelamento do contrato entre a prefeitura e a empresa.