Síndrome adquirida por picada de carrapato pode causar alergia fatal a carne vermelha e laticínios
Agência sanitária dos Estados Unidos alerta para o fato de essa condição ter se tornado mais comum nos últimos anos
Os CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças) dos Estados Unidos fizeram um alerta recente para alto número de casos potenciais de síndrome alfa-gal (AGS, na sigla em inglês), condição que causa alergia "potencialmente fatal" à carne vermelha e laticínios.
Ela foi descrita pela primeira vez em 2008 e desde então já foi identificada na Austrália, África do Sul, Costa Rica, Japão, Coréia do Sul, Suécia, Noruega, França, Itália, Espanha, Alemanha, Suíça, Áustria e Polônia.
A agência sanitária dos Estados Unidos estima de 450 mil pessoas possam ter adquirido a síndrome alfa-gal entre 2010 e 2022 no país, mas o número é impreciso devido ao fato de que muitos profissionais de saúde não estão familiarizados com essa condição médica.
"Evidências sugerem que a AGS está principalmente associada à picada do carrapato estrela solitária [Amblyomma americanum] nos Estados Unidos, mas diferentes tipos de carrapatos não foram descartados. Outras espécies de carrapatos têm sido associadas ao desenvolvimento de AGS em outros países", diz a agência de saúde
A alfa-gal é uma molécula de açúcar presente na maioria dos mamíferos, exceto em primatas (incluindo seres humanos). Também não é encontrada em peixes, pássaros ou répteis. O carrapato estrela solitária tem alfa-gal em sua saliva.
O Manual MSD de Diagnóstico e Tratamento afirma que a picada, ou várias picadas, desse inseto pode sensibilizar a pessoa à alfa-gal presente em diversos alimentos.
"Como a alfa-gal está presente em muitas carnes vermelhas (p. ex., carne de porco, carne bovina, carne de cordeiro, carne de cervo) e em produtos alimentares derivados de mamíferos (p. ex., produtos lácteos, gelatina), as pessoas afetadas podem desenvolver uma resposta alérgica mediada por IgE [um tipo de anticorpo] a esses produtos alimentares", diz o guia médico.
Como toda alergia, algumas pessoas podem evoluir para casos graves.
Os sintomas da síndrome alfa-gal são:
• Urticária ou erupção cutânea com comichão;
• náusea ou vômito;
• azia ou indigestão;
• diarreia;
• tosse, falta de ar ou dificuldade para respirar;
• queda na pressão arterial;
• inchaço dos lábios, garganta, língua ou pálpebras;
• tontura ou desmaio;
• dor de estômago forte.
Esses sintomas costumam aparecer de duas a seis horas após a ingestão de carne vermelha, laticínios ou até mesmo a produtos que contenham alfa-gal, como remédios revestidos de gelatina.
"As reações do AGS podem ser diferentes de pessoa para pessoa. Eles podem variar de leve a grave ou mesmo com risco de vida. A anafilaxia (uma reação potencialmente fatal envolvendo múltiplos sistemas de órgãos) pode necessitar de cuidados médicos urgentes", alertam os CDC.
Em comunicado, a epidemiologista Ann Carpenter, dos CDC, afirma que "a síndrome alfa-gal é um importante problema emergente de saúde pública, com impactos potencialmente graves na saúde que podem durar a vida toda para alguns pacientes”.
Risco no Brasil
Um artigo publicado pelas médicas Karla Arruda e Janaina Lima Melo no Brazilian Journal of Allergy and Immunology, em 2015, aborda a possível existência da síndrome alfa-gal no Brasil, embora até agora não haja relatos oficiais no país.
As autoras mencionam outros carrapatos que podem estar associados à síndrome, como o Ixodes ricinus (Europa), o Ambliomma cajennense (Panamá) e mencionam o Amblyomma sculptum, que é comum no Brasil, como um inseto que desempenhe "um papel semelhante" aos outros.
Um estudo realizado no Brasil descobriu que a saliva do carrapato Amblyomma sculptum contém algo chamado "epítopo alfa-gal" (ume espécie de rótulo molecular), que desencadeia uma forte resposta do sistema imunológico, incluindo a produção de anticorpos IgG e IgE, quando testado em camundongos geneticamente modificados.
Para entender melhor essa ligação entre as picadas de carrapatos, a resposta IgE a alfa-gal e as reações alérgicas à carne vermelha, seria necessário conduzir estudos futuros em pessoas que vivem em áreas com muitos carrapatos ou que estão expostas a eles, sugeriram as autoras naquele ano.
Fernando Mellis, do R7