Israel cancela visita de delegação aos EUA após aprovação de resolução na ONU, dizem autoridades

26/03/2024 04h35 - Atualizado há 1 mês

Integrantes do governo americano chamaram decisão de "surpreendente e lamentável"

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Primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu

18/02/2024REUTERS/Ronen Zvulun

As tensões entre os Estados Unidos e Israel aumentaram nesta segunda-feira (25), após os EUA não vetarem uma resolução no Conselho de Segurança da ONU que exigia um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza.

A decisão dos EUA de se absterem na votação fez com que o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, cancelasse uma viagem programada de dois dos seus principais conselheiros ao país norte-americano, disseram duas autoridades israelenses.

O conselheiro de segurança nacional de Israel, Tzachi Hanegbi, e Ron Dermer, membro do gabinete de guerra e conselheiro próximo de Netanyahu, deveriam viajar a Washington na noite desta segunda-feira (25) para discutir a ofensiva em Gaza e alternativas, mas isso foi cancelado após a votação.

O porta-voz da Segurança Nacional dos EUA, John Kirby, respondeu à decisão de Netanyahu de cancelar o encontro, dizendo que os EUA ficaram desapontados com a decisão.

“Estamos muito desapontados por eles não virem a Washington para nos permitir ter uma conversa exaustiva com eles sobre alternativas viáveis para entrar no terreno em Rafah”, avaliou.

O porta-voz do Departamento de Estado americano, Matthew Miller, classificou o cancelamento de “surpreendente e lamentável”.

Uma autoridade dos Estados Unidos disse à CNN que cancelar a visita foi uma reação exagerada que muito provavelmente reflete as preocupações políticas internas de Netanyahu.

O premiê não se comunicou diretamente com Biden sobre a decisão, e o presidente americano não tem planos de telefonar para Netanyahu para discutir o assunto, complementou a autoridade.

Entretanto, Israel concordou com uma proposta dos EUA sobre um acordo entre prisioneiros e reféns, de acordo com a reportagem do analista da CNN Barak Ravid sobre a recente ronda de negociações em Doha.

O acordo relatado poderia resultar na libertação de cerca de 700 prisioneiros palestinos, entre eles 100 cumprindo penas de prisão perpétua por matar cidadãos israelenses, em troca da libertação de 40 reféns israelenses detidos pelo Hamas em Gaza.

No entanto, o Hamas afirmou que há mais questões para serem resolvidas para além da libertação dos prisioneiros palestinos das prisões israelenses. Integrante de alta patente do Hamas, Basem Naeim, destacou à CNN que a “mídia israelense-americana” estava aumentando a pressão sobre as negociações.

“Para nós, as negociações não se concentram apenas no acordo de troca de prisioneiros”, disse ele.

“Israel não concordou com nenhum dos pedidos (do Hamas) relacionados com um cessar-fogo completo, a retirada de todas as forças da Faixa de Gaza, mesmo em etapas, e a volta de todas as pessoas deslocadas às suas casas”, disse Naeim.

Abstenção dos Estados Unidos

Os Estados Unidos vetaram resoluções semelhantes que exigiam um cessar-fogo anteriormente. Entretanto, essa posição mudou ainda na semana passada, quando, na sexta-feira (22), o país apresentou uma resolução de cessar-fogo vinculada à libertação de reféns.

Esse documento foi vetado pela Rússia e pela China. A abstenção dos EUA na votação desta segunda-feira permitiu a aprovação da última resolução, quando os outros 14 membros do conselho, que tem 15 integrantes, votaram sim.

A embaixadora americana na ONU, Linda Thomas-Greenfield, disse que, embora essa resolução inclua edições solicitadas pelos EUA, não poderia votar “sim”, porque “não concordava com tudo”.

“Um cessar-fogo poderia ter ocorrido há meses se o Hamas estivesse disposto a libertar reféns”, destacou a embaixadora, pedindo aos Estados-membros e ao Conselho de Segurança da ONU para exigirem que o grupo armado “aceite o acordo que está na mesa”.

“Qualquer cessar-fogo deve vir acompanhado da libertação de todos os reféns”, acrescentou.

O documento, apresentado pelos 10 membros não permanentes do Conselho de Segurança, exige cessar-fogo imediato para o mês do Ramadã, a libertação imediata e incondicional dos reféns e “a necessidade urgente de expandir o fluxo” de ajuda para a Faixa de Gaza.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, por sua vez, afirmou que o fracasso na implementação da resolução seria “imperdoável”.

“O Conselho de Segurança acaba de aprovar uma resolução há muito esperada sobre Gaza, exigindo um cessar-fogo imediato e a libertação imediata e incondicional de todos os reféns. Esta resolução deve ser implementada. O fracasso seria imperdoável”, escreveu Guterres no X, anteriormente conhecido como Twitter.

O embaixador de Israel na ONU, Gilad Erdan, criticou o Conselho de Segurança por aprovar a resolução pedindo cessar-fogo “sem condicioná-lo à libertação dos reféns”.

“Isso prejudica os esforços para garantir a sua libertação”, pontuou.

O ministro das Relações Exteriores israelense, Israel Katz, comentou no X que seu país não cumpriria a resolução e não adotaria um cessar-fogo.

“Destruiremos o Hamas e continuaremos a lutar até que o último refém volte para casa”, advertiu.

O governo de Joe Biden optou por se abster em vez de vetar a resolução do Conselho de Segurança da ONU de sexta-feira, quando pôde trabalhar na alteração de certas partes do texto, de acordo com um funcionário importante do governo.

Outra fonte familiarizada com o assunto ressaltou que os EUA planejavam vetar o documento, mas houve intensos esforços diplomáticos para encontrar um compromisso que os fizessem se abster.

Inicialmente, o texto exigia um cessar-fogo permanente e não mencionava negociações para a libertação de reféns, e os EUA conseguiram pressionar para que o texto fosse alterado para que fizesse referência a um cessar-fogo duradouro e incluísse linguagem sobre os esforços em curso de libertação de reféns, segundo a autoridade.

Por estas razões, os EUA acreditavam que a resolução era consistente com a política dos EUA, disse a fonte, uma análise compartilhada pelo secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken.

“Como o texto final não contém uma linguagem chave que consideramos essencial, nomeadamente uma condenação do Hamas, não pudemos apoiá-lo. Esta falha em condenar o Hamas é particularmente difícil de compreender dias depois de o mundo ter testemunhado mais uma vez os atos horríveis cometidos por grupos terroristas”, ponderou Blinken em comunicado.

A votação da ONU nesta segunda-feira ocorreu no momento em que aumentam as tensões sobre uma iminente operação militar israelense na cidade de Rafah, no sul de Gaza.

Os EUA têm apelado a Israel para explicar como irá proteger os 1,4 milhão de palestinos que procuram refúgio na região antes da incursão, que os EUA classificaram que “seria um erro”.

O Embaixador da ONU para os Territórios Palestinos, Riyad Mansour, disse que a decisão foi um voto “para que a vida prevaleça”.

Demorou seis meses para o Conselho de Segurança da ONU exigisse um cessar-fogo imediato e “mais de 100 mil mortos e mutilados, dois milhões de deslocados e fome para que este conselho exigisse imediatamente um cessar-fogo imediato”, comentou Riyad.

*Kylie Atwood, Jennifer Hansler, Abeer Salman e Alex Marquardt, da CNN, contribuíram para esta reportagem

Richard RothIvana, Kottasová Lauren Izso e Jeremy Diamond da CNN